quinta-feira, 30 de maio de 2013

Um pouco mais sobre cantadas: ajuste semântico necessário

Antes de prosseguir, dois avisos importantes:
1) Concordo que abordagens grosseiras às mulheres por parte dos homens (e outras mulheres) são altamente reprováveis;
2) Sou machista (mas não estou dizendo que é tudo bem ser machista, ao contrário).

Åsa Heuser, em seu Uma Ateia Humanista, aborda a questão da cantada. Do que ela chama de cantada-de-rua. Grosso modo, corresponde a cantadas grosseiras ou cantada de pedreiro/feirante...

Creio que haja concordância nos extremos do espectro: abordagens mais suaves - que Heuser chama de 'galanteio', do tipo: "poxa, você está bonita hoje", extremante polida e delicada são permitidas ou aceitáveis (desejáveis?); abordagens rudes do tipo: "e aí, tesuda, que tal uma tchatchaca na butchaca?" são vetadas e condenáveis.

Figura 1. Como algumas feministas veem a questão de cantadas aceitáveis e inaceitáveis. **Fonte.

O problema está no meio do caminho - ou que seria o meio do caminho. Heuser e várias das comentaristas e depoentes em seu "Cantada de rua" consideram ofensivas cantadas do tipo: "gostosa", "delícia". Há feministas que consideram ofensivas também: "essa cadeira está vazia?",

Mas não é uma posição defendida por todas mulheres - e creio que a estimativa de 99% de mulheres que não gostariam dessas cantadas que estou chamando de "meio do caminho" seja irrealisticamente alta - e nem mesmo por todas as feministas.

Abaixo uma seleção de depoimentos de mulheres famosas e desconhecidas (não se pretende aqui estabelecer que a maioria das mulheres gostem, apenas demonstrar que há um certo número delas que recebem bem cantadas que algumas feministas consideram como grosseira):

Algumas análises acadêmicas:

"Em primeiro lugar, a ênfase na decadência do corpo e na falta de homem é uma característica marcante do discurso das brasileiras. Muitas disseram que passaram a se sentir invisíveis depois dos 50 por não receberem mais elogios ou por não serem paqueradas na rua. Algumas relataram, com tristeza, que 'ninguém mais me chama de gostosa'." (Mirian Goldenber 2011)

"No depoimento das meninas e meninos da pesquisa são marcantes esses sinais corporais, quando enumeram qualidades negativas, defeitos, associando-os às representações que têm de si mesmo: 'sou feia e detesto meu cabelo' foi a caracterização que Violeta fez de si. Essa representação de si transmite a seguinte mensagem: sou negra, tenho cabelo de negra e moro num espaço considerado pobre e perigoso. Desse modo, ela pontua como gosta de ser considerada: 'eu gosto ser chamada de gostosa'. Ser 'gostosa' no cotidiano é ter sinais corporais que são valorizados pelo imaginário masculino. É a mulher que quando passa os homens 'mexem': 'ei gostosa!,' atitude muito presente nas ruas do bairro. Isso mostra como o espaço de moradia implica na construção do indivíduo, da alteridade e da relação entre indivíduos, grupos e sociedade, de forma que se constitui numa expressão de marcas culturais que são expressas intensamente na dimensão simbólica do corpo." (Rosângela da Silva Quintela 2003)

Para uma parcela do mulherio que gosta de ser chamada de gostosa, aparentemente há uma ligação com a autoimagem - mas não necessariamente são pessoas com autoimagem ruim. Não dá pra dizer que sejam todas apenas vítimas do machismo a que se submetem - na relação dos depoimentos acima há mulheres que são bem conscientes da questão do feminismo e da desvalorização das mulheres.

Não quero aqui fazer defesa de um suposto direito dos homens de chamarem as mulheres de gostosa, delícia, aimeudeusqueriaissoláemcasa. Não quero tampouco diminuir os dramas reais de mulheres que são tratadas de modo deselegante, desrespeitoso e até violento. Os depoimentos são bem contundentes quanto ao sentimento de insegurança e de indignação que provocam nas mulheres em geral.

Quero chamar a atenção para o fato da diversidade de opiniões a respeito deste ponto - a definição nesta zona intermediária de "cantada-de-rua" é menos clara do que o texto de Heuser faz supor. O ideal de interação imaginada por parcela das feministas (Figura 1) parece muito insosso* - se fosse realmente a maioria das mulheres que se sentissem mal com cantadas do tipo "gostosa/delícia", não haveria muito a fazer a não ser aceitar o fato e *não* se valer desse recurso. Porém, é bem possível que o quadro seja substancialmente diferente.

A divergência não é uma oposição homens x mulheres. Há divergência dentro do próprio grupo feminino (e feminista). Então, dentro dessa zona cinza, é preciso um diálogo mais intenso (e respeitoso) para a construção do sentido de "cantada-de-rua" ou qualquer outra expressão demarcatória do limite entre a cantada aceitável e a inaceitável.

*Upideite(30/mai/2013): Isso se os quatro primeiros quadrinhos representarem o limite superior do aceitável. Ninguém poderia sair da friendzone sem ser considerado um tarado.
**Upideite(31/mai/2013): Adido a esta data.
***Upideite(08/fev/2014): Adido a esta data.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

O anticorintianismo

O jornalista esportivo Flavio Gomes escreveu em seu perfil no twitter:
"Outra coisa gozada dos neocorintianos. Descobriram q torcedor de outro time torce contra. E criaram 'antis'. Sempre foi assim, antas."

Segundo Nelson Rodrigues, o Fla-Flu surgiu 40 minutos antes do nada. Já o anticorintianismo deve ter precedido em éons incontáveis.

A tese de que o anticorintianismo é apenas o fenômeno de torcedor de um time torcer contra qualquer outro time que não o seu é disseminada entre os não-corintianos, mas absolutamente falsa. Se assim fosse, o anticorintianismo seria proporcionalmente tão disseminado quanto o antissampaulinismo, o antipalmeirismo e o antissantismo entre as torcidas paulistas - e seria irrelevante em outras praças em que clubes de outros estados reinam. Não é isso o que ocorre segundo pesquisas. Para os 85% dos palmeirenses, o maior rival é o Timão; 73% dos sampaulino e 67% dos santistas têm a mesma opinião; para flamenguistas, vascaínos e fluminenses, o Corinthians é um rival maior do que o Botafogo.

No acervo da Folha, o termo "anticorintiano" aparece pela primeira vez em reportagem de 20/jun/1974 sobre um novo programa de TV de J. Antonio d'Avila.
"Entretanto, o detalhe explosivo de A Imaginação contra o Milhão, de acordo com d'Avila, é Quem Tem Medo do Corinthians?
'Pretendemos esgotar ao máximo todos os recursos jornalísticos sobre o tema. Apresentaremos corintianos históricos, desembargadores, industriais e poetas, desfazendo a imagem do torcedor criolão. Vasculharemos os arquivos do time alvinegro, mostrando as consequências de suas derrotas e vitórias. Pensamos, ainda, em utilizar flashes de rua, procurando descobrir porque alguém é corintiano ou anticorintiano.'"
(Nota, em 1974, o Timão amargava 19 anos de fila.)



No acervo do Estadão, o primeiro uso é de 20/jul/1982 (pág. 22):
"E segundo o advogado José Izar 'somente um anticorintiano que não reconhece a boa administração do Corinthians é que iria querer que a reunião não acontecesse, para o clube perder este negócio.'"



E é usado pelos próprios torcedores de times rivais (e nem tão rivais assim):
Folha, 28/jan/1979, Folhetim p. 15
"Tava demorando...
Antonio C. Alves Vaz (Osasco, SP) - Sou sampaulino e anticorintiano. Por isso, gostaria de receitar um veneno (a caipirinha corintiana) que eu mesmo fiz, para ser bebido só por corintianos. Aqui vai: ingredientes: verdão, Sócrates, conhaque (de preferência 'Palhinha'), um Jairo, Taborda e um Biro-Biro. Modo de fazer: pega-se um Jairo e enche-se até a taborda. Pega0se um verdão e soc(r)a-tes, soc(r)a-tes. Soc(r)a-se um pouco de Palhinha e depois, 'biro... biro... biro' (manda-se pro papo). Obs: cuidado para não se engasgar com o verdão
 R - Pronto! Já tava demorando! Depois de um bom tempo sem rusgas futebolísticas ('rusgas' é ótimo...) entre os leitores, aparece-me mais um engraçadinho querendo tocar fogo no circo. Obs: isso aqui não é o 'Diz, Torcida', não senhor: Comportem-se."

Folha, 03/fev/1980, 3o caderno p. 30
"Eu sou São Paulo - confessa o funcionário público - José Bernardes  - mas vou torcer novamente pelo Corinthians, pois no fundo todo anticorintiano é um mentiroso e invejoso."

Folha, 14/mai/2001
"Adelino Galla presidente do Comercial 'Vou torcer para o Botafogo na final do Paulista. Sou anticorintiano. Torço contra o Botafogo apenas quando o time joga contra o Comercial, pois a rivalidade não pode ser maior do que os interesses da cidade. Esse resultado é importante para Ribeirão.'"

Jornal do Brasil, 10/jun/2011
"O fato é que já passei por isso antes, mas desta vez me precavi, associei a data a coisas inesquecíveis e relevantes: 1993 o Palmeiras goleia o Corinthians por 4x0 e leva o Paulistão depois de 17 anos na fila (não sou palmeirense, mas sou anticorintiano)[...]"

UOL, 27/jun/2012
"'Eu sou anticorintiano. Não tem jeito', disse um morador de Curitiba."

Folha Online, 17/dez/2012
"Fabio Bolsanelli, 34, gosta de futebol, mas não torce para nenhum time. 'Sou anticorintiano mesmo', falou."

Não é, portanto, uma invenção corintiana (muito menos dos jovens corintianos) - o anticorintianismo existe mesmo e é como anticorintiano que os secadores do time alvinegro do Parque São Jorge se identificam - chegam a torcer a favor dos maiores rivais locais de seus times para derrotar o Timão. O 'anti' é apenas uma redução de 'anticoritiano', do mesmo modo que 'cine' ou 'cinema' é redução de 'cinematógrafo'. A novidade é apenas esse apelido depreciativo ou 'carinhoso' - oras, se os anticorintianos desprezam o Timão, os corintianos têm todo o direito de menosprezarem o anticorintianismo. Grande parte da graça do futebol é o de tirar sarro dos torcedores adversários.

terça-feira, 7 de maio de 2013

A tal "bolsa crack" - a ideia pode não ser ruim

O governador paulista Geraldo Alckmin está certo em reclamar que "bolsa crack" é um apelido maldoso. Seria mais apropriado chamá-lo de "bolsa ANTIcrack".

O valor (R$ 1.350/mês - durante seis meses) parece injusto para quem não tem nenhum problema com crack - seja um dependente químico ou tenha parente dependente. Mas, ao contrário de certas reações ao anúncio, não é uma recompensa ao drogadito. Nem uma recompensa à família do drogadito.

A grana é para ser aplicada exclusivamente no tratamento. Que não é barato. Mas não poderia usar isso para investir em centros públicos e oferecer o tratamento gratuito? Em parte sim. Porém o tratamento é individualizado, não é trivial o governo manter uma rede de clínicas que possam oferecer todos os tratamentos especializados possíveis. Seria necessário contratar e treinar pessoal, comprar equipamentos e instalações...

A alternativa seria, em vez de dar o dinheiro para a família, reembolsar as clínicas cadastradas. É possível. Mas a vantagem do dinheiro ser por meio de cartão fornecido aos parentes é criar um duplo controle. No sistema de reembolso, toda a comprovação parte da clínica - que um paciente se internou, que tais e tais procedimentos foram aplicados. No caso do cartão, há dados tanto oriundos da família - naturalmente as operações do cartão são registradas -, quanto das clínicas. Assim, permite-se fazer um cruzamento e verificar se os valores estão sendo devidamente utilizados. (Não, não é 100% seguro contra fraudes. Porém, diminui a brecha.)

Há que se verificar como isso será efetivamente implantado e operado. Porém, não me parece uma má ideia à partida.

A crítica que se pode fazer é se esse valor será suficiente. Eu acredito que em muitos casos não. Sobretudo pela limitação temporal de apenas seis meses de tratamento. Mas é melhor do que nada. O problema do crack é realmente devastador como tragédia pessoal e familiar, e o custo social de não tratar os dependentes pode ser bem maior - como casos de violência associada às drogas.

Programa similar está em operação em Minas Gerais desde 2011. Desconheço os resultados.

domingo, 5 de maio de 2013

A tal "bolsa bandido" - e quando o bandido usa GAP?

A revista Veja, em sua chamada para matéria de capa desta semana (ed. 2320):
"Uma cruel inversão de valores
No Brasil, familiares de alguém morto por bandidos não têm direito a nenhum benefício exclusivo, ao passo que as famílias dos presos contam com o auxílio-reclusão – ou 'bolsa-bandido'. Para ajudar a restaurar a distinção entre vítimas e criminosos, a reportagem VEJA percorreu o país para ouvir crianças e adolescentes que perderam o pai, a mãe ou ambos nas mãos de assassinos Revista VEJA Edição 2320 8 de maio de 2013 É revoltante.
É intolerável
O estado ampara as famílias de quem cometeu crimes bárbaros. Quem cuida das vítimas?"

Não tem direito *exclusivo*, mas tem direito, no caso, à pensão por morte. Corresponde a 100% do valor da aposentadoria que recebia a vítima ou a que teria direito em caso de invalidez. O valor médio do benefício pago é de R$ 756.

O auxílio-reclusão, bom notar que quem recebe é a *família* não o presidiário, é pago apenas se o segurado estiver preso em regime fechado ou semi-aberto sem receber salário (não é pago se estiver em liberdade condicional ou em regime aberto e é suspenso se o segurado estiver fugido) e há um teto para o salário de contribuição que tem direito ao benefício (atualmente é de R$ 971,78) - o benefício é apenas para famílias carentes. O benefício médio pago é de R$ 681,86. Tampouco é *exclusivo* para quem for preso por homicídio.

Qual o motivo de revolta? Se um sujeito comete crime e é preso, a família deve ficar na miséria sem arrimo? Não.

Se um sujeito morre, a família deve ficar na miséria sem arrimo? Não.

Os dois casos são atendidos.

A família do morto também pode pedir indenização:
"Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima."

Se necessário, podem também ser atendidas, via SUS, para apoio psicológico. Em nível estadual, há ainda os Centros de Apoio às Vítimas de Crimes. O Cravi (Centro de Referência e Apoio à Vítima), de São Paulo, em novembro do ano passado, lançou uma cartilha de orientação às vítimas e seus familiares.

Nem todos esses instrumentos, infelizmente, funcionam como se desejaria e, claro, a dor da perda dificilmente é compensada por qualquer apoio material; mas maniqueísmo barato que se aproveita justamente da dor alheia é algo altamente reprovável - infelizmente tem se tornado padrão, não apenas da Veja, mas de todo um setor midiático que pretende capitalizar em cima das inseguranças do brasileiro (bem como de seu conservadorismo).

Vale lembrar palavras da própria Veja, há 15 anos, quando da terrível morte do índio pataxó Galdino dos Santos, queimado vivo por jovens brasilenses quando dormia em um banco de praça:
"Qualquer pessoa honesta com seus sentimentos sabe que, diante de um crime brutal, às vezes o que se deseja não é justiça mas a vingança, que dá satisfação imediata, alivia e até repara a dor sentida. Mas a Justiça não é isso. Ela existe para que as partes sejam ouvidas, os fatos examinados e, por fim, um juiz, no silêncio de seu gabinete, dê uma sentença de acordo com a lei e com sua consciência. É fácil pedir punições exemplares especialmente quando se trata dos filhos alheios. Também é agradável empolgar-se com o clamor popular a dificuldade é que, muitas vezes, se clama pelas causas erradas, ou mesmo por penas injustas, ou até pela condenação de inocentes, como ocorria no Brasil nos anos do regime militar."

O que mudou de lá para cá? Apenas o ano? Será que o fato de o crime de então ter sido cometido por jovens da classe média contra um índio miserável ativou uma visão mais comedida?

quinta-feira, 2 de maio de 2013

O ECA protege menores sociopatas?

No facebook a neurocientista Suzana Herculano-Houzel adiantou o tema de sua coluna na Folha. Diz a cientista em um dos parágrafos:

"Lembrando: cometer um crime hediondo não é garantia de sociopatia (embora seja mais que meio caminho andado...), mas os especialistas sabem muito bem reconhecer os sociopatas homicidas. Acredito que o risco de colocar na cadeia um menor de idade não sociopata seria ínfimo - e com isso a sociedade ganharia proteção daqueles sociopatas que, como eles bem sabem fazer, se aproveitam da proteção atual que o Estatuto da Criança e do Adolescente lhes garante." (grifo meu)

É um equívoco comum. De fato, o ECA diz:
"Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.
§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida.
§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
§ 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público."

O parágrafo 6o faz com que sociopatas diagnosticados - e indivíduos que apresentem grau de periculosidade incompatível com a vida em sociedade - *não* sejam liberados. São internados em hospitais psiquiátricos.

Diz a lei 5.258/1967:
"Art. 2º São as seguintes as medidas aplicáveis aos menores de 14 a 18 anos
II - se os elementos referidos no item anterior evidenciam periculosidade, o menor será internado em estabelecimento adequado, até que, mediante parecer do respectivo diretor ou do órgão administrativo competente e do Ministério Público, o Juiz declare a cessação da periculosidade.
§ 1º Completada a maioridade sem que haja sido declarada a cessação da periculosidade, observar-se-ão os §§ 2º e 3º do art. 7º do Decreto-lei número 3.914, de 9 de dezembro de 1941.
§ 2º O Juiz poderá sujeitar o menor desligado em virtude de cessação de periculosidade à vigilância, nas condições e pelo prazo que fixar, e cassar o desligamento no caso de inobservância das condições, ou de nova revelação de periculosidade."

Ou seja, para os fins a que se refere SHH, *não* há nenhuma necessidade de alteração dos dispositivos legais. Bastando sua correta aplicação.

Não considero um anátema a discussão da alteração da maioridade penal ou do tempo máximo de internação de menores. É uma questão presente e, devidamente encaminhada, salutar para a autocompreensão da sociedade: que sociedade queremos, como queremos tratar nossos jovens? Só acho que:
1) Ela deve ser realizada com base em argumentos embasados - sem distorções sobre o conhecimento científico a respeito da psicologia humana (não é o caso de que SHH tenha distorcido), sobre a realidade legal (é o caso aqui, credito que ao desconhecimento da legislação por SHH), das condições sociais, do sistema prisional, etc.
2) Alteração na maioridade penal dificilmente afetará o ponto que está por trás da discussão: a redução da violência criminal no país (no caso, cometido por menores). Para tanto creio que seria mais produtivo discutir dois aspectos: a modificação das condições sociais que levam um indivíduo a entrar na vida criminosa e a modificação das condições prisionais e pós-pena que levam um indivíduo a continuar na vida criminosa. Nosso sistema prisional é, nas palavras do Ministro da Justiça, medieval. Extremamente inadequado à recuperação dos encarcerados - com índice de reincidência de 70%. Compare-se com a Noruega, em que há apenas 20% de reincidência. Claro, não são apenas as prisões mais humanas, é a *estrutura social* norueguesa como um todo que contribui para tanto a baixa criminalidade em geral - como baixa desigualdade social, um estado de bem estar social eficiente, um sistema educacional adequado, etc.

Upideite(02/mai/2013): Discordo também que o risco de se colocar na cadeia menor não sociopata seria ínfimo. Como aponta Ogloff 2004 (para personalidades antissociais em geral): "As currently construed, the diagnosis of antisocial personality disorder grossly over-identifies people, particularly those with offence histories, as meeting the criteria for the diagnosis." ["Como atualmente concebido, o diagnóstico de desordem de personalidade antissocial identifica pessoas em grande excesso, particularmente entre aquelas com histórias de delitos, como atendendo aos critérios diagnósticos."]

Upideite(02/mai/2013): Outro ponto em que discordo de SHH. Se sociopata não deixa de ser sociopata, prender para *punir* (como ela sugere em outro parágrafo do mesmo texto) não faz sentido. Seria apenas vingança. A justificativa tem que ser - como é legalmente - o afastamento do convívio social pela periculosidade que representa.

Upideite(07/mai/2013): Coluna da SHH sobre prisão de adolescentes sociopatas.