sábado, 23 de abril de 2016

Golpe e legalidade. Assim não é, nem se lhe parece.

Escrevi alhures.
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"O impeachment segue todos os ritos formais, logo não é golpe."
Eu discordo de que siga todos os ritos formais (as várias manobras pra forçar um resultado - p.e., a escolha bizarra da ordem de votação da admissibilidade). Mas, para fins de argumentação, consideremos que esteja dentro dos rigores das prescrições legais (p.e. se houvesse escapada, o STF iria brecar - não acredito nisso também, num órgão que inventou uma interpretação bisonha de 'domínio de fato' -, mas é um argumento).
Embora a estrita observância dos trâmites legais seja condição sine qua non de legalidade, ela, por si mesma, ainda que numa democracia, não é garantia de que a justiça está sendo feita.
É possível se dar contra-exemplos reais (então não precisamos recorrer a exemplos hipotéticos ou fictícios como o Senador Palpatine ser aclamado Imperador Galático).
A condenação do morador de rua Rafael Braga por "porte de aparato explosivo", quando ele tinha um frasco de Pinho Sol.
Hugo Cháves não fugiu da lei ao reapresentar proposta de emenda constitucional de reeleição para referendo (2009) logo depois de derrotado em plebiscito (2007). Mas foi um (auto)golpe.
Um dia depois de a Câmara rejeitar proposta de redução da maioridade penal (cuidado! contém paywall poroso), Dudu Cunha reapresentou a proposta, com modificações mínimas, que foi aprovada.
O Congresso aprovou e a presidenta sancionou a lei que libera a prescrição e administração da fosfoetanolamina para pacientes com câncer mesmo sem o registro devido na Anvisa - e sem os dados sobre segurança e eficácia.
O CFM aprovou a homeopatia como especialidade médica em 1980.
Desembargadores mantiveram a condenação de um homem por estupro, mesmo análise de ADN indicar que o sangue encontrado no local do crime não é dele (e nem da vítima).
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Tudo nos estritos rigores da lei, tudo decisão mais do que ruim.
Já é ruim os casos em que, a despeito da patente injustiça, é também patente que o caso se encaixa no que é previsto na lei. Mas ainda dá para se conformar.
Quando manobras são realizadas para que o caso se ajuste no que dita a lei, é mais do que hora de levantar a bandeira vermelha (sem conotação socialista - ou, se a imagem lhe é ruim, então, "mais do que hora de soar o alarma").


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quarta-feira, 20 de abril de 2016

Doria, é golpe sim.

Reposto aqui (com pouca modificação) o que comentei no facezucko.

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Pedro Doria mandando mais uma furada. Agora argumentando que o presente processo de impedimento contra a presidenta Dilma Rousseff é, ainda que traumático, absolutamente legal.

Sim, Mensalão e Petrolão ocorreram, como lembra Doria. Mas nem uma coisa nem outra nem ao menos constam como motivo de pedido de impeachment. E a presidenta Dilma não tem nada provado contra ela - não está indiciada, não é ré em processos relacionados aos casos.

As pedaladas. Pedro Dória só se esquece que, mês antes do TCU reprovar as contas da Rousseff por causa delas, a Câmara aprovou as contas de FHC e Lula que tinham as tais pedaladas.

Ignora também todas as manobras realizadas para forçar o resultado desejado pelo presidente da Câmara e o resto da oposição. Culminando com a escolha bisonha da ordem de votação, que acumulava votos "sim" em excesso na primeira metade do total de votos (abrindo espaço para influir na decisão dos parlamentares que estivessem indecisos ou até mesmo as defecções das orientações partidárias em contrário). (Fig. 1)


Figura 1. Efeito da ordem de votação. Painel superior: azul (ordem adotada na votação pela Câmara de admissibilidade de impeachment em 17/abr/2016); laranja (votação em ordem alfabética); verde limão (taxa constante). Painel inferior: diferença de votos "sim" acumulados da ordem adotada (azul) e da ordem alfabética (laranja) em relação à taxa constante; em amarelo diferença entre a ordem adotada e a alfabética.

As racionalizações de que o presente processo de impedimento da Dilma não é golpe me iluminam muita coisa sobre como 1964 pôde acontecer.

Por essa linha de argumentação tomada por Doria, a prisão de Rafael Braga por porte de Pinho Sol é muito justa. Afinal cabe à Justiça decidir se desinfetante é ou não um produto perigoso.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Olha o breque!

Pedrinho acha que as mídias sociais são uma ótima oportunidade para troca de informações e para manutenção de contato com amigos e parentes que estão distantes (são também oportunidades de negócios para muitos, mas não é a onda do Pedrinho).

Nesse espírito engajou-se em várias delas: em particular o twitter e o facebook (este último meio a contragosto). Umas rusgas ali e outra acolá, normal, dada a falibilidade das comunicações e variações de humor (de Pedrinho, dos interlocutores e das pessoas em geral); o balanço geral era positivo. Os contatos ajudaauxiliavam a filtrar notícias relevantes, ajudando-o a manter-se atualizado, a sanar dúvidas, a divulgar seus trabalhos, a complementar a humana necessidade de comunicação (complementar, pois a comunicação offline ainda é primordial: mesmo que se possa pedir comida por meio de aplicativos, Pedrinho compra na padaria perto de casa, vai ao supermercado; conversa com colegas de trabalho, vai ao cinema, fala com os amigos pessoalmente também...)

Porém, recentemente a experiência tem se tornado insatisfatória. Não apenas pelo noticiário estar menos e menos confiável, pelo aumento de circulação de boatos e desinformações, que seus contatos inadvertidamente ajudam a espalhar (e ocasionalmente o próprio Pedrinho, mesmo com seu esforço de filtrar os engodos). Mas, sobretudo, pelas rusgas, ocasionais e irrelevantes que de antanho, acumularem-se e tornarem-se mais frequentes. Não apenas com contatos desconhecidos, mas também com amigos que conhece pessoalmente.

Claro que se poderia atribuir as desinteligências a Pedrinho - afinal, o maior ponto em comum das discussões inamistosas é ele. Mas, analisando a comunicação - as mídias sociais (a maior parte delas) têm a vantagem de deixar o registro dessas trocas de mensagens -, Pedrinho crê que não é dele o principal erro. E, quando mostra a terceiros, não envolvidos nas altercações verbais, o parecer é de inocência de Pedrinho (ainda que se possa suspeitar pelo fato de os juízes serem amigos de Pedrinho).

As queixas em relação a Pedrinho são um tanto variadas, ainda que alguns temas sejam recorrentes. Uma das que mais o entristecem são as que direta ou indiretamente implicam em acusação de alguma forma de desonestidade intelectual. A honestidade intelectual é algo peloa qual Pedrinho é muito cioso. Sempre que possível, Pedrinho procura fornecer referências das fontes nas quais ele baseia sua opinião. Quando é apenas um achismo, Pedrinho salienta tal fato. Evita opinar a respeito das coisas de que não considera possuir um mínimo de conhecimento da causa: nos blogues que mantém quase nunca comenta polêmicas no calor dos fatos, espera passar um tempo justamente para coligir mais informações e ter uma melhor perspectiva do panorama geral.

Algumas acusações versam que Pedrinho não costuma admitir erro. O que é falso. Quando o erro é demonstrado cabalmente, Pedrinho imediatamente reconhece. E muitos erros são detectados por ele mesmo, após uma reanálise dos fatos: os textos em seus blogues são cheio de palavras tachadas mostrando o que havia sido escrito anteriormente de modo errôneo e com destaque colorido os acréscimos posteriores; e procura manter as postagens com atualizações destacadas do corpo do texto. Pedrinho sabe que isso torna a diagramação dos textos particularmente antiestética, mas crê que a transparência do processo de correção pós-publicação compensa isso. Tweets de correção também são apensados - como respostas - aos tweets anteriores com erros (quando considera que há risco do erro se espalhar, como último recurso, Pedrinho deleta o tweet errado: não é algo que o agrade, pois é um registro perdido); dá RT em tweets de segundos e de terceiros com as correções. Em atualizações de status no facebook, acrescenta erratas na edição do texto principal; e coloca observações nos comentários.

Uma das broncas é pelo fato de Pedrinho ser turrão. E isso ele admitidamente o é. Mas apenas até que se demonstre os erros. Quando isso implica que Pedrinho é enrolão, ele fica muito #chatiado. Pedrinho raramente debate por debater. O faz no espírito de ganhar e de partilhar conhecimento. Não pra ganhar debates ou pontos (Pedrinho desconhece programas de milhagem para debatedores). Quando adentra para detalhes sem importância maior para o tema central de uma discussão, Pedrinho geralmente alerta que está comentando apenas algo que é preciosismo ou, de modo jocoso e autodepreciativo, picuinha. A insistência no debate de temas aparentemente laterais dá-se para Pedrinho no propósito de esclarecer algo importante por si mesmo - ainda que não atinja o ponto central - ou por, contrariamente à avaliação de desimportância, considerar que afeta, sim, a apreciação do elemento em tela.

Humano como é, tais aborrecimentos, por vezes, desanimam Pedrinho. Com a sucessão recente, o desgosto atingiu-lhe um nível que o faz avaliar que não está valendo a pena manter uma presença ativa nas redes sociais.

Eu aconselharia ao Pedrinho para ele dar uma espairecida, afastando-se um tanto por algum tempo. A decisão de abandonar definitivamente os perfis parece um tanto radical demais.

segunda-feira, 14 de março de 2016

Retrato de uma sociedade quando jovem e nem tão jovem

Pensando aqui no status do Pedro Doria no facezucko com imagens justapostas da presidenta Rousseff e de uma pintura de Debret.

Considero que o jornalista (autor dos livros 1565 e 1779, ótimos complementos à trilogia anonumérica do também jornalista Laurentino Gomes sobre a história do Brasil) tem um bom ponto, mas que também tem limitações.

É verdade que uma imagem isolada, tirada do contexto, pode ser interpretada de maneira diversa da realidade (sem entrar em discussões geralmente estéreis sobre realismo/antirrealismo).

Mas, de um lado, levada a cabo, isso se aplica também à imagem de Debret. Será que aquilo mostra uma relação de dominação senhorial sobre os negros escravos na época do Brasil Colônia? Haverá imagens de sinhazinhas carregando sua própria sombrinha - ou talvez os retratistas tenham deixado isso escapar. Beeeem, pra fazermos isso temos que deixar de lado o que sabemos a respeito da época: dos documentos escritos e outros registros que permitem interpretarmos os retratos de Debret como uma representação (de outro lado, nem sempre acurada) do cotidiano de uma sociedade escravocrata.

Assim, as pinturas de Debret devem ser interpretadas dentro de um contexto conhecido sobre o funcionamento da sociedade da época - e, a partir disso, isso nos fornece informações adicionais a respeito dessa mesma sociedade (além de informações a respeito das técnicas artísticas e da biografia do próprio Debret). E, sim, dentro de limites.

Podemos aplicar o mesmo raciocínio para outras representações iconográficas de outra épocas e sociedades. Inclusive sobre o guarda-costas-chuvas da presidenta Rousseff e inclusive sobre a foto de uma família classemédia brasileira em um domingo de sol nas manifestações com a babá de uniforme.

Há uma lista extensa de literatura científica (antropológica mormente) a respeito da relação entre patroa (e a família da patroa) e a emprega doméstica/babá.

Não é meramente uma relação trabalhista, no geral. (Nenhum trabalho se resume a uma mera relação trabalhista, mas a relação com os empregados domésticos é mais extremada nas questões que transbordam e tangem as relações estritamente trabalhistas.)

Trecho de resumo de trabalho de Jurema Brites (2007), antropóloga da UFJF:
"Na realização das tarefas de cuidado e manutenção das famílias de camadas médias no Brasil – desempenhada, na esmagadora maioria das vezes, por mulheres pobres, fora da parentela dos empregadores – assim como nas formas de remuneração e de relacionamento que se desenvolvem entre patrões e empregadas domésticas, reproduz-se um sistema altamente estratificado de gênero, classe e cor. A manutenção desse sistema hierárquico que o serviço doméstico desvela tem sido reforçada, em particular, por uma ambigüidade afetiva entre os empregadores – sobretudo as mulheres e as crianças – e as trabalhadoras domésticas."

Nesse sentido, não é exatamente verdadeira a frase de Doria a respeito da foto da babá de que o retrato não quer dizer nada.

Disclêimer: Cresci - a partir de um momento - em família que contava com trabalho de empregados domésticos.

sábado, 5 de março de 2016

Procuradoria da República em Curitiba não sabe ler

A Procuradoria da República em Curitiba publicou nota defendendo o uso da condução coercitiva do ex-presidente Lula. Pelas argumentações, ela não sabe ler porque o que está escrito no Código de Processo Penal é bem diferente do que ela quer fazer crer.

"3. Considerando que em outros 116 mandados de condução coercitiva não houve tal clamor, conclui-se que esses críticos insurgem-se não contra o instituto da condução coercitiva em si, mas sim pela condução coercitiva de um ex-presidente da República."

Nope. Se os 116 mandados anteriores foram nas mesmas condições realizadas, então o MPF em Curitiba violou a lei 117 vezes.

"5. No que tange à suposta crítica doutrinária, o instituto da condução coercitiva baseia-se na lei processual penal (cf. Código de Processo Penal, arts. 218, 201, 260 e 278 respectivamente e especialmente o poder geral de cautela do magistrado) e sua prática tem sido endossada pelos tribunais pátrios."

Vamos então ao Código do Processo Penal:
Art. 201.
"Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações.
§ 1o Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade."

Não cabe. Tenta outra. (Lula é o ofendido?)

Art. 218.
"Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública."

Não cabe. Tenta outra.

Art. 260.
"Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença."

Não cabe. Tenta outra.

Art. 278.
"No caso de não-comparecimento do perito, sem justa causa, a autoridade poderá determinar a sua condução."

Não cabe. Tenta outra. (Lula é perito agora?)

"7. Trata-se de medida cautelar muito menos gravosa que a prisão temporária e visa atender diversas finalidades úteis para a investigação, como garantir a segurança do investigado e da sociedade, evitar a dissipação de provas ou o tumulto na sua colheita, além de propiciar uma oportunidade segura para um possível depoimento, dentre outras."

Arrancar uma perna é muito menos gravosa do que matar. So what? Foi ilegal.

"11. Após ser intimado e ter tentado diversas medidas para protelar esse depoimento, incluindo inclusive um habeas corpus perante o TJSP, o senhor Luiz Inácio Lula da Silva manifestou sua recusa em comparecer."

Ao que não era obrigado a comparecer, ué.

Vejamos o que o Ministério Público de São Paulo disse ao Jornal Nacional: "por um erro, Lula e Marisa tinham sido notificados de que eram obrigados a ir prestar depoimento. O promotor Cássio Conserino esclareceu que Lula e Marisa não são obrigados a prestar depoimento no Ministério Público."

"13. Assim, para a segurança pública, para a segurança das próprias equipes de agentes públicos e, especialmente, para a segurança do próprio senhor Luiz Inácio Lula da Silva, além da necessidade de serem realizadas as oitivas simultaneamente, a fim de evitar a coordenação de versões, é que foi determinada sua condução coercitiva."

Agora, fio, ache nos artigos citados lá no item que 5 que falam em condução coercitiva onde, deabos, fala que o mecanismo é usado para segurança pública?

Não tenho formação em direito. Mas estou respaldado por opinião de vários especialistas em direito. Como o ex-ministro da Justiça de FHC, José Gregori; e Walter Maierovich, ex-secretário de FHC da política antidrogas; ou mesmo o ministro do STF, Marco Aurélio Mello.

" 15. Por fim, tal discussão nada mais é que uma cortina de fumaça sobre os fatos investigados.

16. É preciso, isto sim, que sejam investigados os fatos indicativos de enriquecimento do senhor Luiz Inácio Lula da Silva, por despesas pessoais e vantagens patrimoniais de grande vulto pagas pelas mesmas empreiteiras que foram beneficiadas com o esquema de formação de cartel e corrupção na Petrobras, durante os governos presididos por ele e por seu partido, conforme provas exaustivamente indicadas na representação do Ministério Público Federal."

Sim, é preciso investigar! Mas dentro da lei! Cortina de fumaça é falar que é preciso investigar para ocultar uma flagrante ilegalidade por agente público no exercício de sua função - e, no caso, não é do Lula, que não é flagrante, é objeto de investigação; mas do MPF e, por conseguinte, da PF que seguiu as instruções formuladas ao arrepio da lei.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Kibando o Nick Ellis: #366Rabiscos - semana 5

Semana anterior.






quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Os perigos ocultos da DC

Há alguns riscos ocupacionais nos trabalhos de Divulgação Científica que são costumeiramente pouco abordados.

Nem é o fato de, para o cientista, ser uma atividade vista com desconfianças pelos colegas, que atrapalhe sua produtividade acadêmica, etc. Alguns preferem trabalhar anônimos: até para evitar cobrança de seus pares acadêmicos quando exerce atividade crítica à própria profissão.

Também não é a chateação de dedos apontados pelos sociólogos das ciências de que a DC feita é de qualidade ruim, de rasgação de seda das ciências, pouco crítica - ou, no caso de jornalistas, de dedos apontados pelos cientistas de que a qualidade é ruim, que é excessivamente crítica, superficial, não aborda os pontos relevantes... (É uma chateação que tem seu valor para apontar defeitos reais que ocorrem.) As críticas podem ser não tão construtivas, como em um editorial da Revista Psicologia USP que conclui: "A própria atividade de divulgação pode ser considerada responsável pelo mal que ela procura combater".*

Igualmente não são as apropriações indébitas dos textos - o Nerdologia já foi alvo de alguns canais que simplesmente traduziam (sem autorização e sem pagamento, portanto) para o espanhol e publicavam sem nenhum crédito à fonte original; textos de divulgação do Meio Bit também são alvos de pirataria e também dos ScienceBlogs; um vídeo dos Minutos Psíquicos foi copiado do YouTube e republicado, com a remoção das partes dos créditos, em uma página no facebook...*

Não são os comentários trolls, de pessoas sem um entendimento adequado sobre o tema mas com opiniões fortes e definitivas, os spammers.

Há um risco que é a extensão do hate mail, dos comentários raivosos... Fakes, páginas e vlogs voltados para o escárnio e ataques sistemáticos à honra de determinados divulgadores começam a surgir e ganhar corpo. (Logicamente recuso-me a dar link para tais.)

Sim, a via usual e inevitável é denunciar as páginas para os provedores do serviço - o que nem sempre tem um efeito imediato - e, depois, seguir para o processo judicial - etapa ainda mais morosa e custosa. Mas o estrago já está feito.

Pode ser à reputação, pode ser à evitação dos visitantes usuais (para não se depararem com ações agressivas e coordenadas por parte dos detratores).

Há algumas razões por que os divulgadores viram alvo de tais ataques odiosos.

À medida em que o divulgador ganha visibilidade, torna-se um alvo fácil para aqueles que gostam de atacar gente com alguma fama; mas mesmo ainda antes de se tornarem celebridades (uma minoria dos divulgadores são de fato muito conhecidos por um público extenso), a divulgação científica com frequência toca em temas objetos de intolerância por determinados grupos: a experimentação animal (alvo de ataque por parte de determinados grupos de defesa dos direitos animais - vários laboratórios já foram invadidos, sendo o de mais destaque a destruição e fechamento do Instituto Royal em São Roque-SP), a teoria da evolução (atacada por criacionistas - que têm vários grupos relativamente bem organizados e bem irrigados com dinheiro de instituições religiosas fundamentalistas), a tecnologia transgênica (vários grupos ambientalistas e de trabalhadores rurais são ferranhamente contrários - pesquisas foram tratoradas em centros invadidos por integrantes de movimentos de trabalhadores sem-terra), laicidade (a interferência religiosa em aulas de ciências e pesquisa científica - com sobreposição às ações dos criacionistas), reprodução (antiabortistas, anti-educação sexual, anti-uso de preservativos...), sexualidade (homóbicos, misóginos), etc.

Pessoalmente conheço quatro casos de ataques a divulgadores que são amigos e conhecidos meus ocorridos nos últimos 5 anos (em uma conta de engenheiro, isso corresponde, bem grosseiramente, a um risco anualizado de cerca de 1% de que um determinado divulgador seja vítima de interpelação pessoal hostil ou uso indevido de imagem; é bastante coisa). Em dois deles houve interpelação pessoal por desconhecido no meio da rua.

Por sorte não houve uma agressão física, mas se trata de uma invasão inaceitável da esfera pessoal, privada, íntima.

A maioria dos divulgadores nem ganha para exercer essa atividade. É quase como um hobby: recebem para serem pesquisadores, jornalistas, professores... No tempo livre, procuram produzir vídeos, textos, áudios para ajudar na disseminação do conhecimento e da cultura científicos. Sendo atividades independentes, de pessoas físicas, muitos não contam com uma estrutura jurídica de uma empresa de comunicação que possa protegê-los e tomar conta do assunto em caso de agressão dessa natureza (como ocorre no caso de jornalistas que trabalham em grandes conglomerados de comunicação).

Quando a caixa de comentários ganha pernas e está a sua frente, o que um divulgador pode fazer? (Em um caso, o divulgador conseguiu manter o sangue frio e até acabou demovendo o agressor, que pediu desculpas pelo ato. Mas não dá pra contar com a sorte de que sempre será possível uma argumentação amistosa a desarmar ânimos exaltados, e exaltados ainda mais por páginas de ataques sistemáticos à honra do divulgador.)

Upideite(28/jan/2016): Um perigo potencial (já enfrentado por blogueiros de outras áreas, em especial jornalistas políticos) são ações de políticos e empresários que tiveram interesses contrariados pelas opiniões dos divulgadores (especialmente se este tiver uma maior visibilidade). Felizmente, ainda não conheço nenhum caso entre meus amigos**.

Upideite(28/jan/2016): Há, claro, alguns ganhos na atividade de DC. Em alguns casos, ela é reconhecida pelos pares, pode ajudar na promoção (mas depende da instituição e do grupo), alguns são remunerados (com bolsas, salários, patrocínios, AdSense...), outros sentem-se recompensados pelo reconhecimento amistoso pelos assinantes de seus canais e comentários de incentivo. Além, é claro, do sentimento de estar contribuindo com uma atividade relevante de esclarecimento do público.

*Upideite(31/jan/2016): adido a esta data.

**Upideite(05/fev/2016): Acaba de mudar. O canal do Slow teve um vídeo censurado pela ação de um deputado.