quarta-feira, 27 de março de 2013

CCJ extingue soberania nacional

Para quê serve a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara Federal dos Deputados? Teoricamente para analisar as propostas legislativas quanto à constitucionalidade e garantias fundamentais do cidadão brasileiro.

Os excelentíssimos senhores integrantes da CCJ, no entanto, acabam de aprovar a admissibilidade  da PEC 99/2011 de autoria de João Campos do PSDB-GO. Essa PEC inclui entre as instituições que podem entrar com ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) e ação declaratória de constitucionalidade (ADC) as associações religiosas de âmbito regionalnacional. Diz o autor na justificativa:

"Após bom debate, a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional deliberou por apresentar proposta de Emenda à Constituição objetivando inserir Associações Religiosas de caráter nacional (exemplo: CGADB - Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil, CONAMAD - Convenção Nacional das Assembléias de Deus no Brasil Ministério Madureira, CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, Convenção Batista Nacional, Colégio Episcopal da Igreja Metodista, etc.)"

CNBB é ICAR. A ICAR tem um estado, o Vaticano. Vão mesmo deixar uma instituição sob ordens de um estado estrangeiro meter o bedelho em leis nacionais?

Nos etcs., creio, sob pena de discriminação religiosa, incluírem os anglicanos. A Igreja Anglicana está sob ordens do monarca inglês. Vão deixar uma instituição sob ordens de um regente estrangeiro meter o bedelho em leis nacionais?

Nossa lei impede que partidos políticos estrangeiros financiem campanhas em território nacional. Estrangeiros residentes no país não podem participar de manifestações que eventualmente sejam contrários aos interesses nacionais. E vão, assim, de bandeja entregar parte substancial de nossa soberania à entidades regidas por chefes de estados estrangeiros - nos exemplos acima: Francisco do Vaticano e Elizabeth II do Reino Unido?

Não dá pra apenas excluir esses casos e deixar o resto, isso seria discriminação religiosa. A única alternativa sensata é excluir *todas* as denominações religiosas igualmente da possibilidade de impetrarem uma ADIN ou uma ADC.

Um atentado tão óbvio à soberania nacional - um dos valores orientadores da Constituição Federal - passou pela CCJ. Para que serve a CCJ? (Espero que a temeridade dessa PEC seja barrada em alguma instância mais centrada.)

Upideite(28/mar/2013): Há ainda que se notar que muitas denominações protestantes são ramos de igrejas cristãs com sedes em outros países - onde as orientações principais são tomadas. O mesmo vale para igrejas de outras religiões que seguem líderes residentes no exterior, como a Seicho-no-Iê.

Upideite(28/mar/2013): Disclêimer: Eu sou arcipreste de uma igreja oficialmente reconhecida no Brasil, a Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio.

Upideite(28/mar/2013): Em nome da liberdade religiosa, há muito pouca restrição à abertura de novas igrejas no país. A IHSE foi aberta com o propósito de demonstrar que é mais fácil abrir uma igreja do que uma empresa. Concordo que deva ser assim. Essa grande liberdade, no entanto, permite que pessoas pouco honestas - picaretas mesmo - tenham suas próprias igrejas. A PEC 99/11 é temerária também nesse aspecto. Qualquer um, inclusive pessoas mal intencionadas, podem ter sua igreja e teriam o poder de entrar com ADIN e ADC - por exemplo, um traficante de drogas poderia dizer que uma lei sobre controle de psicotrópicos atrapalharia sua igreja, que diz que entorpecentes são canais para comunicação com sua divindade (e temos seitas e igrejas que usam substâncias alteradoras de estados de consciência em seus rituais). A justificativa de que a PEC é democratizante e permite que associações religiosas questionem leis que possam afetar seus interesses caberia para quase tudo - por que associações feministas não poderiam, então, entrar com ADIN contra leis que possam afetar direitos das mulheres? Por que associações ambientalistas não poderiam ter o mesmo direito de questionar leis que possam fragilizar a proteção à natureza?

Upideite(28/mar/2013): Grupos estrangeiros poderiam facilmente criar igrejas no país e interferirem em temas nacionais para benefício próprio. Soberania zero. Para impedir isso teria que se restringir a atividade religiosa, o que não é nada desejável. Então é melhor derrubarem essa ideia fora de lugar.

Updieite(28/mar/2013): Estou enviando o email abaixo para os nobres deputados federais:
"Excelentíssimo Senhor Deputado Federal XXXX,

Por meio desta gostaria de chamar a atenção para a inconstitucionalidade do PEC 99/2011 por atentar contra a soberania nacional.

A CNBB é um órgão colegiado da Igreja Católica Apostólica Romana que responde diretamente a um estado estrangeiro, o Vaticano.

Os filiados ao anglicanismo também respondem a um soberano estrangeiro, a Rainha da Inglaterra.

Como, por outro lado, não faz sentido excluir somente estas denominações, por implicar em discriminação religiosa, e, por outro, outras denominações e religiões responderem a uma matriz e líderes que estão em outros países, nenhuma associação religiosa deveria ter o poder de impetrar um pedido de ADIN ou ADC.

Cordialmente,

Roberto Takata"

Upideite(29/mar/2013): Abaixo, o esquema de como a soberania nacional é afetada pela PEC 99/2011.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Sobre a lei paulista 14.955/2013: ninguém parou pra pensar nos motivos lícitos para se ocultar a face?

Com a boa intenção de combater assaltos a estabelecimentos comerciais, especialmente postos de gasolina, por motoqueiros com identidade oculta sob capacete, o governo de São Paulo baixou uma lei que proíbe a entrada e permanência de pessoas em estabelecimentos comerciais com uso de capacetes e coberturas que escondam o rosto. Quem descumprir a norma, paga multa de R$ 500 - R$ 1.000 em caso de reincidência.

------------
Artigo 1º - Fica proibido o ingresso ou permanência de pessoas utilizando capacete ou qualquer tipo de cobertura que oculte a face nos estabelecimentos comerciais, públicos ou privados.
§ 1º - Os efeitos desta lei estendem-se aos prédios que funcionam no sistema de condomínio.
§ 2º - Nos postos de combustíveis, os motociclistas deverão retirar o capacete antes da faixa de segurança para abastecimento.
§ 3º - Os bonés, capuzes e gorros não se enquadram na proibição, salvo se estiverem sendo utilizados de forma a ocultar a face da pessoa.

Artigo 2º - Os responsáveis pelos estabelecimentos de que trata a presente lei deverão afixar, no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data de sua publicação, uma placa indicativa na entrada do estabelecimento, contendo a seguinte inscrição:
“É PROIBIDA A ENTRADA DE PESSOA UTILIZANDO CAPACETE OU QUALQUER TIPO DE COBERTURA QUE OCULTE A FACE”.

Parágrafo único - Deverá ser feita menção, na placa indicativa, ao número desta lei, bem como à data de sua publicação, logo abaixo da inscrição à qual se refere o “caput” deste artigo.
Artigo 3º - A infração às disposições da presente lei acarretará ao responsável infrator multa no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), aplicada em dobro em caso de reincidência.
Artigo 4º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.


------------


Só que a lei não prevê nenhuma exceção. Nenhuma. Ne-nhu-ma.

O governador Geraldo Alckmin é médico de formação e se orgulha disso. Não pensou em pessoas que usam máscara por causa de queimaduras - ou outras coberturas faciais de uso médico. Não são muitas,  felizmente, mas elas ficam como?

E, em número maior, como ficam os trabalhadores desses estabelecimentos que por um motivo ou outro devem usar coberturas que ocultam o rosto? Um soldador fica como? E um palhaço contratado para fazer apresentações em um shopping center?

Como é que, em todo o processo de confecção dessa lei - da redação às mesas das comissões da Alesp - ninguém, ninguém, nin-guém, pensou nesses casos?

(A legislação paulista, embora diferente nos propósitos e no âmbito, remete à lei francesa do véu, que admite todas as exceções acima e mais algumas. Ninguém pensou em consultar dispositivos correlatos?)

Upideite(15/mar/2013): E desconfio da utilidade da lei. Um assaltante que vá roubar um posto, vai obedecer à nova lei pra quê?

sexta-feira, 8 de março de 2013

Royalties do petróleo: Faça as contas, Merval!

Disse o jornalista Merval Pereira para o Jornal das 10 da GloboNews:
"A nova divisão não servirá para resolver o problema de nenhum ente federativo, pois a repartição geral gerará muito pouco para cada um dos envolvidos, mas os estados produtores sofrerão grandes perdas." (grifo meu)

Em 2011, segundo o Anuário Estatístico 2012 da ANP, foram rateados 12,99 bilhões de reais de royalties de petróleo e gás entre União, Estados e Municípios - produtores e não-produtores. (Desconsideremos os royalties dos novos blocos - uma estimativa de produção inicial do pré-sal é de 1 milhão de barris diários - o que projetaria um extra de 6 bilhões de reais em royalties.)

Com a nova lei - e derrubada do veto presidencial (e a depender da decisão do STF após pedido de análise por parte dos estados e municípios produtores) - a divisão do bolo gerado pela exploração dos blocos novos e com contratos já em vigor será de 27% a ser distribuído entre municípios não-produtores.

27% de 12,99 bi são: 3,5 bilhões. São 5.561 municípios no Brasil. Não sei exatamente quantos são os municípios produtores no Brasil. Mas devem ser poucos, então o total do rateio será de cerca de 630 mil reais por ano por município.

De onde o Merval Pereira tirou que isso é muito pouco? Pode ser pouco para municípios de grande orçamento.Mas para 2.423 municípios seria um incremento de 5% nas finanças de 2009 (segundo os dados disponíveis no IBGE), dos quais, 366 teriam um aumento de mais de 10% no orçamento  E os números podem ser maiores com os royalties dos novos campos.

Para a cidade do Rio de Janeiro, os 100 milhões de reais em royalties que recebe atualmente representam 0,86% do orçamento de 2009. Os 3,1 bilhões que o Estado do Rio de Janeiro recebe em royalties são 12,5% do orçamento de 2009.

Merval Pereira deve estar ganhando muito bem como imortal da ABL pra achar que 600 mil reais por ano não sejam nada.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Brasileiro pode ser processado por crime no exterior?

Reproduzo comentário que enviei ao blogue do Luis Nassif a respeito da trágica morte do jovem boliviano Kevin Espada e a confissão por um adolescente brasileiro.

=============
Alguém poderia me explicar qual a base legal para se processar no Brasil um brasileiro nato por crime cometido no exterior?

Diz o código penal brasileiro:

Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
 II - os crimes:
 b) praticados por brasileiro;
 § 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; 
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
-----------------
Aplicam-se as alíneas 'a', 'b', 'd' e 'e'; mas não a alínea 'c', pois diz a Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;
-------------------
Então, pelo que entendi, o garoto não poderia ser processado - mesmo que fosse adulto. Não no Brasil.
[]s,
Roberto Takata

=============

Upideite(26/fev/2013): Complemento
=============

A jurisprudência nega minha interpretação. Há dois casos no STJ de julgamento de brasileiro nato por crimes cometidos no exterior:
Mas ainda acho que são decisões - do ponto de vista legal - equivocadas. Especialmente o primeiro caso, em que parecem ter entendido as condicionantes do parágrafo 2o do artigo 7o do Código Penal como condicionantes suficientes, em vez de de condicionantes necessárias (sendo suficiente somente a observação de todas ao mesmo tempo).
"1. Aplica-se a extraterritorialidade prevista no art. 7.º, inciso
II, alínea b, e § 2.º, alínea a, do Código Penal, se o crime foi
praticado por brasileiro no estrangeiro e, posteriormente, o agente 
ingressou em território nacional."
[]s,
Roberto Takata

=============

Upideite(07/mar/2013): Tem ainda o fato de que, por se tratar de menor, o homicídio não se tratar propriamente de crime mas de ato infracional.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Desagradar a gregos e troianos = imparcialidade. Será?

O jornalista Juca Kfouri reclama (com razão) da crítica ranzinza dos anônimos e nem tão anônimos comentaristas - de internet e leitores de jornais. Mas sugere que o fato de ser criticado por todos os lados é sinal de que cumpre bem seu papel de imparcialidade e equilíbrio.

Não se contesta aqui o excelente trabalho de Kfouri. Apenas esse mito recorrente (ele não é o único a argumentar nessa linha) de que a grita geral sinaliza que se está apertando nos calos de todos equanimemente.

Ocorre que ele mesmo nota que muito disso - se não no todo - deve-se a um clima chamado de Fla-Flu. Visões extremistas opostas que não aceitam qualquer tipo de crítica sem enxergar nisso algum tipo de conspiração dos adversários. Então qualquer texto que não esteja nesses extremos opostos são alvo de saraivadas raivosas dos dois lados (ou de mais, quando os há), não importa se penda mais para um lado ou para outro.

No máximo, tal padrão de crítica generalizada indica que o criticado não faz parte de nenhuma panela mais extremada. E não muito mais do que isso. Pela própria baixa capacidade de matização dos críticos não é possível usar isso como sinal de adequamento equidistante entre as partes.

Oras, Kfouri é assumidamente esquerdista. Apenas não é bolchevique ou versão despirocada da esquerda revolucionária armada como as defendidas por grupos como o PCO ou PSTU. Receber crítica destes não indica que esteja afastado da esquerda.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

"No Brasil, pagamos impostos demais". Talvez não.

O jornalista Paulo Nogueira, em seu blogue Diário do Centro do Mundo, critica editorial da Folha de São Paulo sobre a carga tributária brasileira.

Não sei exatamente a qual editorial o jornalista se refere. Há vários da Folha tratando o tema. Em um deles, o jornal sugere reduzir o PIS/Cofins (federal) e simplificar o ICMS (estadual); ainda que o ICMS seja a maior fatia da carga tributária total: 7,2% contra 4,8% do PIB.

Nogueira compara a carga tributária do Brasil. Maior do que o México, mas menor do que países escandinavos. Por outro lado, os favoráveis à redução da carga tributária, comparam com EUA e Japão, com carga menor do que a brasileira. Quem tem razão?

Pela Figura 1, vemos a relação entre a carga tributária (considerando apenas a arrecadação do governo central - no caso do Brasil, apenas impostos federais) e o IDH para 99 países.

Figura 1. Correlação entre carga tributária (como porcentagem de impostos recolhidos para o governo central em relação ao PIB) e o IDH. (Brasil: vermelho; linha vertical: média da carga tributária dos países analisados; linha horizontal: média do IDH) Ano base: 2010. Fontes: Banco Mundial e Pnud.


Se há alguma relação, é uma bem fraca em que um maior IDH corresponde a uma maior carga tributária - comportando grande variação entre países. A carga tributária brasileira é bem próxima à média dos países analisados e seu índice de desenvolvimento também corresponde praticamente à média do IDH dos países e está bem próxima à reta de correlação - isto é, não desvia muito da média de desenvolvimento dos países com carga tributária similar.

É difícil cravar que aumentar a carga tributária levará ao aumento do desenvolvimento do país. É verdade que programas como redução da pobreza, melhoria da educação e da infraestrutura, demandam maior investimento público. E maior investimento público necessita de uma maior arrecadação. Por outro lado, isso depende também de uma maior eficiência nos investimentos. Muita coisa se perde no meio do caminho, pela ineficiência e pelo desvio de verbas.

Mas a análise de Nogueira parece mais próxima à realidade revelada pelos números do que a visão classemédia de que se paga muito imposto no Brasil.

(Via Escrevinhador.)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Despedida de um amigo: Manuel Bulcão (1963-2012)

No blogroll à direita, o leitor notará que o blogue "A arte do conceito" não é atualizada há 5 meses. E a última postagem é "MANUEL SOARES BULCÃO NETO (1963-2012)" de 24 de agosto de 2012.

Quando subiu essa postagem, não quis acreditar no que o título implicava. Com uma poesia não explícita, imaginei que poderia ser alguma mensagem enigmática do meu amigo Bulcão.

Cheguei a postar um comentário lá, esperando esclarecimentos. Como não me responderam por um tempo, dei de ombros. Mas uma resposta foi postada vinte dias depois, por um outro amigo de Bulcão e que só agora vi - confirmando a perda lamentável.

"Caro Roberto Takata. Nosso amigo Bulcão morreu no dia 23 de agosto, poucos dias depois de completar 49 anos. Em "Sobre a Consciência", de As Esquisitices do Óbvio, ele escreveu: "Quanto ao homem, uma consequência do seu grande poder de previsão é, precisamente, a consciência da morte, da sua própria e dos seus entes queridos. E como, além de perseguir pequenos projetos cotidianos, o homem, contrariamente ao chimpanzé, também se guia por um projeto maior, um "projeto de vida", a morte - que, sabe ele, pode ocorrer a qualquer momento - sendo uma ameaça constante a qualquer plano pessoal que se tem como razão de viver, representa uma inesgotável fonte de angústia". 

E, no entanto, creio poder assegurar que o Manuel (a partir da conversa que tivemos na UTI, no último dia em que lhe foi possível ainda falar) não se encontrava angustiado, mas bastante tranquilo, perante a possibilidade tão iminente da morte; 'não estou com medo' foram suas palavras. 'A morte não é uma negação ou ruptura da vida, mas sua completude'. E ficamos nós, os amigos, muito menos tranquilos, pasmos diante dessa óbvia esquisitice, a despedida de Manuel Soares Bulcão Neto.

p.s: creio, Takata, que você gostará de saber o quanto Bulcão o tinha em consideração. Várias vezes ele o mencionou, e sempre com admiração."

Em sua curta carreira literária nos legou quatro obras:
- As esquisitices do óbvio (2005) - Ápex Editora;
- Sombras do iluminismo (2006) - Editora 7Letras;
- A eloquência do ódio (2009) - LivroPronto Editora;
Contra o princípio copernicano (2012) - Emooby.

Não são textos de leitura fácil - ainda que longe da obscuridade de textos acadêmicos de pretensa densidade -, mas são argumentos muito bem estruturados. São leituras que provavelmente tirará o leitor da zona de conforto. Se quiser contra-argumentar, terá que suar muito e munir-se mais do que de retórica vazia ou apreciação ligeira das formas.

Mas nessas horas... a gente só consegue pensar em como a vida é injusta em sua frieza insensível aos dramas humanos.