quarta-feira, 11 de abril de 2012

Am I loosing loosing my mind?*


O STF começou hoje o julgamento da ação a respeito do aborto de fetos anencefálicos.

Realmente não consigo alcançar as razões dos que se postam contra a permissão da interrupção da gravidez nos casos em que seja constatada a ausência do encéfalo nos fetos.

Cerca de 2/3 dos fetos anencefálicos não chegam ao fim da gravidez. A maioria dos que nascem, morrem clinicamente (têm parada cárdio-respiratória irreversível) em menos de 1 hora - quase nenhum chega a mais de uma semana. O caso de maior destaque de sobrevida foi brasileiro - o bebê diagnosticado como anencefálico teve morte clínica após 1 ano e 8 meses do parto - e provavelmente não se tratava de um anencefálico propriamente dito. Mas vamos supor que haja vida humana antes da morte clínica; então não é a presença de um cérebro funcional que define a vida. Onde ela estará, então? No corpo todo, menos no cérebro? Digamos que sim, então amputar um braço ou uma perna pra salvar o corpo é abominável? Bem, acho que ninguém se obstaria a essa amputação. Portanto, nos membros não está a vida humana. No tronco? Alguém acha que receber o fígado, os pulmões, os rins, o coração, etc. de alguém faz com que o receptor passe a ser a pessoa do doador? Não. E mais. Se não está no cérebro, poderíamos muito bem tratar os casos de "transtorno de identidade de integridade corporal" simplesmente removendo o encéfalo do paciente - salvaríamos o corpo e, portanto, a vida humana. Parece absurdo? Espero que sim.

A única que me pareceu razoável é a de que haveria riscos de falsos positivos, levando à interrupção de fetos viáveis por engano. Porém, no que consegui levantar na literatura científica disponível, nos casos de diagnóstico por ultrassonografia, a possibilidade de falso positivo é virtualmente nula. Nenhum caso em 171 (não, não há nenhum estelionato envolvido) 251 diagnósticos positivos para a anencefalia se mostrou equivocado. Então, se feito o exame por profissionais competentes de modo adequado, o risco é quase que incomparavelmente menor do que o risco que se impõe à mãe de fazê-la levar a gestação a termo.

Se o casal, em particular a mãe, após receber o diagnóstico de anencefalia do feto, quiser levar a gestação a termo, tudo bem. Mas deveria ser também tudo bem se quisesse interromper a gravidez que não gerará um rebento viável. Para muitas pessoas seria um tormento a mais, por que obrigá-las a sofrer sem necessidade?

*Versos da canção "Loosing my mind", escrita por Stephen Sondheim e interpretada por vários artistas, entre os quais Liza Minnelli

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