domingo, 5 de maio de 2013

A tal "bolsa bandido" - e quando o bandido usa GAP?

A revista Veja, em sua chamada para matéria de capa desta semana (ed. 2320):
"Uma cruel inversão de valores
No Brasil, familiares de alguém morto por bandidos não têm direito a nenhum benefício exclusivo, ao passo que as famílias dos presos contam com o auxílio-reclusão – ou 'bolsa-bandido'. Para ajudar a restaurar a distinção entre vítimas e criminosos, a reportagem VEJA percorreu o país para ouvir crianças e adolescentes que perderam o pai, a mãe ou ambos nas mãos de assassinos Revista VEJA Edição 2320 8 de maio de 2013 É revoltante.
É intolerável
O estado ampara as famílias de quem cometeu crimes bárbaros. Quem cuida das vítimas?"

Não tem direito *exclusivo*, mas tem direito, no caso, à pensão por morte. Corresponde a 100% do valor da aposentadoria que recebia a vítima ou a que teria direito em caso de invalidez. O valor médio do benefício pago é de R$ 756.

O auxílio-reclusão, bom notar que quem recebe é a *família* não o presidiário, é pago apenas se o segurado estiver preso em regime fechado ou semi-aberto sem receber salário (não é pago se estiver em liberdade condicional ou em regime aberto e é suspenso se o segurado estiver fugido) e há um teto para o salário de contribuição que tem direito ao benefício (atualmente é de R$ 971,78) - o benefício é apenas para famílias carentes. O benefício médio pago é de R$ 681,86. Tampouco é *exclusivo* para quem for preso por homicídio.

Qual o motivo de revolta? Se um sujeito comete crime e é preso, a família deve ficar na miséria sem arrimo? Não.

Se um sujeito morre, a família deve ficar na miséria sem arrimo? Não.

Os dois casos são atendidos.

A família do morto também pode pedir indenização:
"Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima."

Se necessário, podem também ser atendidas, via SUS, para apoio psicológico. Em nível estadual, há ainda os Centros de Apoio às Vítimas de Crimes. O Cravi (Centro de Referência e Apoio à Vítima), de São Paulo, em novembro do ano passado, lançou uma cartilha de orientação às vítimas e seus familiares.

Nem todos esses instrumentos, infelizmente, funcionam como se desejaria e, claro, a dor da perda dificilmente é compensada por qualquer apoio material; mas maniqueísmo barato que se aproveita justamente da dor alheia é algo altamente reprovável - infelizmente tem se tornado padrão, não apenas da Veja, mas de todo um setor midiático que pretende capitalizar em cima das inseguranças do brasileiro (bem como de seu conservadorismo).

Vale lembrar palavras da própria Veja, há 15 anos, quando da terrível morte do índio pataxó Galdino dos Santos, queimado vivo por jovens brasilenses quando dormia em um banco de praça:
"Qualquer pessoa honesta com seus sentimentos sabe que, diante de um crime brutal, às vezes o que se deseja não é justiça mas a vingança, que dá satisfação imediata, alivia e até repara a dor sentida. Mas a Justiça não é isso. Ela existe para que as partes sejam ouvidas, os fatos examinados e, por fim, um juiz, no silêncio de seu gabinete, dê uma sentença de acordo com a lei e com sua consciência. É fácil pedir punições exemplares especialmente quando se trata dos filhos alheios. Também é agradável empolgar-se com o clamor popular a dificuldade é que, muitas vezes, se clama pelas causas erradas, ou mesmo por penas injustas, ou até pela condenação de inocentes, como ocorria no Brasil nos anos do regime militar."

O que mudou de lá para cá? Apenas o ano? Será que o fato de o crime de então ter sido cometido por jovens da classe média contra um índio miserável ativou uma visão mais comedida?

2 comentários:

André disse...

A Veja parece aquele cunhado que entope nossa caixa de e-mail com todo tipo de hoax. O link abaixo eu achei bastante interessante também: http://comfelelimao.wordpress.com/2012/02/16/a-volta-da-bolsa-bandido/

none disse...

Salve, André,

Enfrentar o maniqueismo é bem complicado mesmo.

Valeu a visita e comentário.

[]s,

Roberto Takata