terça-feira, 26 de julho de 2011

O IBGE também não sabe ler 2

Consultei o IBGE por email:
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From: rmtakata@xxxx
To: ibge@ibge.gov.br
Subject: Info sobre “Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População: um Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça”
Date: Fri, 22 Jul 2011 12:05:26 -0300

Prezados Senhores,

Gostaria de saber qual a composição dos respondentes em raça/cor declarada entre os que responderam "Não" à pergunta 3.06 sobre a influência da raça/cor na vida das pessoas.

Agradeço desde já a informação.

Cordialmente,

Roberto Takata
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Nota: A pergunta 3.06 era: "EM SUA OPINIÃO, NO BRASIL A VIDA DAS PESSOAS É INFLUENCIADA POR SUA COR OU RAÇA?" Admito que pode não ter ficado clara a minha pergunta por não fazer menção direta à pergunta de qual pesquisa - mas o título era informado no assunto do email.

Responderam:
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Subject: Info sobre “Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População: um Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça” Atendimento Numero:#55455/2011 - 1#
To: rmtakata@xxx
Date: Mon, 25 Jul 2011 18:22:13 -0300
From: ibge@ibge.gov.br

Atendimento Numero:#55455/2011 - 1#

Prezado Roberto Takata,

Agradecemos o contato e o interesse nos nossos produtos e pesquisas e Informamos que o quesito ora solicitado é denominado de \"cor ou raça\" e não apenas de \"cor\" ou apenas de \"raça\" , exatamente porque as categorias que englobam podem ser entendidas pelo entrevistado de forma bastante diversa. Quem responde \"branca\" não necessariamente está entendendo a categoria como uma categoria de sua \"raça\" assim como quem responde \"preto\" - que por definição trata-se de uma categoria de \"cor\" - pode estar, no seu entendimento, respondendo a um atributo de sua \"raça\" ou origem racial, o que torna a questão complexa. Ou seja, como a questão envolve elementos de atribuição de \"identidade\" e \"percepção\" não se pode controlar objetivamente o que cada categoria representa subjetivamente para cada entrevistado e que trazem reflexos sobre a sua resposta. A questão é realmente complexa e o IBGE tem empreendido esforços para acompanhá-la. Foram realizadas duas grandes pesquisas - uma na PNAD de 1976 e uma PME de julho de 1998 - que procuraram investigar o uso e o reconhecimento dessas categorias que designam cor, raça ou origem, onde o entrevistado respondia ao quesito de forma ABERTA, ou seja, com sua própria categoria de identificação. Essas pesquisas foram realizadas exatamente com o intuito de sondar como se deveria construir o quesito para os Censos de 1980 e de 2000. Os resultados da PNAD 1976 já foram objeto de várias análises de pesquisadores, publicadas em diversas revistas especializadas sobre o tema e geraram no IBGE o livro \"O Lugar do Negro na Força de Trabalho\" de Tereza Cristina Araújo, Rosa Maria Porcaro e Lucia Elena G. de Oliveira. A análise dos resultados do teste da PME 1998 está também publicado pelo IBGE/DPE e se intitula \"A Cor Denominada\" de José Luis Petruccelli, lembramos ainda que o IBGE também realizou vários seminários com usuários internos e externos com a presença de vários segmentos do movimento negro, órgãos e entidades de pesquisa que tiveram a oportunidade de discutir e encaminhar propostas de alteração do quesito que seriam testadas em suas duas Provas Piloto. Entre outras sugestões, que também foram incorporadas nos testes, estava a sugestão de trocar a categoria \"preta\" por \"negra\" e \"parda\" por \"mestiça\". O que se verificou, quanto ao primeiro caso, foi que o questionário com a categoria \"preta\" tinha mais respostas do que aquele que substituía essa categoria por \"negra\", semelhante ao que ocorreu com a categoria \"mestiça\", demonstrando que o entrevistado reconhece melhor as categorias \"preto\" e \"parda\" que \"negra\" e \"mestiça\". Ainda que essas informações não possam ser consideradas \"definitivas\" como não pode ser nenhum dado que investigue uma questão desse tipo, o IBGE, baseado nas pesquisas que tem realizado sobre o tema, não teve condições de implementar, com segurança e confiabilidade nos resultados (que precisam atender a quesitos como comparabilidade histórica, representatividade num país das dimensões e desigualdades como o nosso), nenhuma mudança nesse quesito, ainda que reconheça como legítimas e procedentes as demandas que tem recebido por parte de segmentos da sociedade e pesquisadores.
Segue os dados disponibilizados, para tanto você deverá entrar em nosso portal www.ibge.gov.br - clicar em sidra - censo demográfico - características gerais da população - cor e raça

Atenciosamente,
Equipe de Atendimento

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Upideite(27/jul/2011): Insisti:
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\"....26/07/2011 14:59:05 NovoDe: rmtakata@xxx
Assunto: RE: Info sobre “Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População: um Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça”
Atendimento Numero 55455

Prezados Senhores,

Grato pela resposta, mas minha dúvida é de outra natureza.

Em relação à pesquisa com o nome: “Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População: um Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça”, na pergunta 3.06 os entrevistados responderam se achavam que a cor ou raça tinha influência na vida das pessoas. Uma parte (63,7%) respondeu que sim, tem influência. Outra parte (33,5%) respondeu que não, não tem influência. (E uma fração residual 2,8% respondeu que não sabia.)

O que eu gostaria de saber é, dentre os que responderam que não tem influência, quantos (em porcentagem) se declararam brancos e quantos se declararam negros (pretos e pardos). E, dentre os que responderam que tem influência, quantos se dissseram brancos e quantos se disseram negros.

Agradeço mais uma vez a atenção
Roberto Takata...\"
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Finalmente responderam - infelizmente não têm a informação:
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Subject: RE: Info sobre “Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População: um Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça” Atendimento Numer Atendimento Numero:#55455/2011 - 3#
To: rmtakata@xxx; jlpetru@xxx
Date: Wed, 27 Jul 2011 13:12:37 -0300
From: ibge@ibge.gov.br

Atendimento Numero:#55455/2011 - 3#

Prezado Senhor,

Agradecemos o contato e o interesse em nossos produtos e, aproveitamos pra informar que lamentavelmente os dados disponíveis são aqueles consignados na pesquisa. Não temos como fazer uma tabulação especial, conforme vossa senhora solicitou. Informamos ainda que novas tabulações estão sendo desenvolvidas, devendo as mesmas, serem divulgadas em breve. Tomamos a liberdade de enviar seu pedido para o setor responsável pela pesquisa

Atenciosamente,
Equipe de Atendimento

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Upideite(06/ago/2011): Pra mim não deram a informação, mas o Felipe Gutierrez da Folha conseguiu dado equivalente: dos que se declararam negros, 82,6% disseram que a raça ou cor influencia no trabalho; 64,7% entre os que se declararam índios. (Notar que é uma pergunta distinta: é especificamente sobre o trabalho, não sobre a influência na vida - daí a média ser de 71% e não de 63,7%. Claro que, a rigor, há uma inconsistência, posto que trabalho faz parte da vida, então, no máximo, o índice teria que ser igual, nunca maior; mas ao se apresentar perguntas distintas, as pessoas provavelmente isolam o componente trabalho na pergunta sobre a vida: seria algo como a vida em geral, fora do trabalho - com os amigos, na hora de se divertir, ir ao cinema, etc.)

A AmBev também não sabe ler

Enviei a mensagem abaixo ao serviço de atendimento da Skol/AmBev:
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Nome: Roberto Takata
Email: rmtakata@xxx
DataNascimento: xx/xx/xxxx
Cep: xxxxx-xxx
Endereco: ,
Complemento:
Celular: (xx) 0000-0000
Fax: ()

Comentário:
Prezados Senhores, A respeito da Skol 360o; gostaria de saber que testes foram realizados para garantir que o produto evita a sensação de estufamento ao ser consumido com alimentos calóricos. Gostaria de saber também qual a diferença do processo de fermentação 360o em relação aos processos tradicionais de fermentação cervejeira. Agradeço desde já pela atenção. Cordialmente, Roberto Takata
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Enviaram a seguinte resposta:
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From: sac@skol.com.br
To: rmtakata@xxx
Subject: RE: Portal Skol Senha - SAC
Date: Mon, 25 Jul 2011 13:53:03 -0300

Boa tarde Roberto,
Agradecemos o seu contato ele é muito importante para nós.
Líder no Brasil há mais de dez anos, a Skol revolucionou o mercado de cervejas introduzindo as principais inovações do setor. Para atender a todos os gostos dos consumidores, a marca dá novamente um passo à frente e apresenta o mais importante lançamento da AmBev: a Skol 360°. O produto, fruto da combinação de ingredientes inéditos com um moderno processo de produção, atende a um grupo de pessoas que se sente estufado quando bebe cerveja. O resultado é um produto com bebabilidade , denominação da marca para um líquido com balanço entre sabor e leveza e que não estufa.
A Skol 360° possui o mesmo DNA de Skol: inovadora, irreverente e com espírito jovem. Porém, cada uma das cervejas possui um atributo e fórmulas únicas que as diferencia e atendem a diferentes gostos dos consumidores.
Dúvidas estamos á disposição.
Atenciosamente,
Josi Dutra
Serviço ao Consumidor Skol
sac@skol.com.br
0800-725 0002
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Upideite(27/jul/2011): Continuou assim:
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From: Roberto Takata [mailto:rmtakata@xxxx]
Sent: terça-feira, 26 de julho de 2011 14:15
To: sac@skol.com.br
Subject: RE: Portal Skol Senha - SAC

Prezados Senhores,

Como foi medida a "sensação de estufamento"?

Grato,

Roberto Takta
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Responderam:
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From: sac@skol.com.br
To: rmtakata@xxx
Subject: RE: Portal Skol Senha - SAC
Date: Wed, 27 Jul 2011 11:26:34 -0300

Olá Roberto.
Agradecemos o seu contato, ele é muito importante para nós!
Informamos que possuíamos uma política para divulgação das informações sobre os nossos produtos e sobre a nossa empresa.
Desta forma, disponibilizamos o site para que você tenha acesso às informações sobre a marca do produto e a empresa possíveis de serem divulgadas.
Contamos com a sua compreensão.

Caso tenha alguma dúvida, entre em contato conosco através do 0800 725 0002.
Mantenha sempre contato, estamos a sua inteira disposição.
Atenciosamente,
Bruna Alves
Serviço ao Consumidor Skol
sac@skol.com.br
0800-725-0002
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Vamos ver se a pós-moderação do Observador Político funciona

FHC e cia. lançaram um projeto interessante, uma plataforma para a discussão de temas políticos. Os interessados só precisam se cadastrar e podem postar comentários e iniciar discussões sobre diversos temas de interesse nacional.

Lógico que há regras. Infelizmente há pessoas de má índole que burlam não apenas as regras do projeto, como ferem a própria lei e manifestam seu naco de intolerância. Felizmente, apesar do tom áspero de não poucos comentários, são raros os casos extremados, envolvendo preconceito explícito de raça, gênero, origem... Achei um só (reproduzido abaixo) por enquanto. Já denunciei ao serviço de moderação do Observador Político. Vamos ver quanto tempo demoram pra remover*. O comentário é a esta postagem.

*Upideite(27/jul/2011): Como observa André, nos comentários, já retiraram a mensagem racista do OP. Agora consta: "[ COMENTÁRIO DELETADO POR INFRAÇÃO AO CÓDIGO DE CONDUTA ]", mas o autor continua como membro. De todo modo, a pós-moderação funcionou - levou pouco mais de 24 horas para removerem.

sábado, 23 de julho de 2011

Fim do sigilo eterno: vai ou não vai?

A lei do sigilo eterno, tecnicamente um decreto (DEC 4.533/2002), a que FHC assinou sem ler, no apagar das luzes de seu segundo governo, está para ser revista.

Pela imprensa está complicado, no entanto, acompanhar qual a posição do governo.

14/abr/2011
13/jun/2011
15/jun/2011
17/jun/2011
22/jun/2011
25/jun/2011
23/jul/2011

É a presidenta Dilma que a cada hora muda de posicionamento ou não está conseguindo se explicar, é a imprensa quem faz confusão?

Só sei que precisamos urgentemente de um FOIA nos moldes do americano.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Lifebuoy pra prevenir resfriados?

Já falei sobre o sabonete Lifebuoy antes. Eles tornaram a forçar a amizade com a peça publicitária abaixo:



Ocorre que resfriado bacteriano é extremamente raro. Em um estudo com 200 casos de resfriados comuns, somente 7 casos podem ser associados a bactérias como possível causa. O estudo conclui:
"The common cold is a viral illness for which the etiology can be shown in most cases. Bacterial coinfections are very rare." ["O resfriado comum é uma doença virótica para a qual a etiologia pode ser comprovada na maioria dos casos. A coinfecção bacteriana é muito rara."]

E lembrando, lavar as mãos (e o corpo) com sabonetes comuns pode eliminar 98% das bactérias - contra os 99,9% dos sabonetes antibacterianos. E são muito mais baratos.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O corintianismo

Cada clube de futebol, claro, tem sua história que o aproxima e o diferencia dos demais. Pode-se comparar tamanhos de torcida, número de conquistas, o patrimônio, os jogadores que vestiram suas camisas, as cotas de patrocínio... mas isso não é o Corinthians, Corinthians é outra coisa.

O Corinthians se destaca em todos os quesitos acima, mas não é isso que o torna verdadeiramente especial. Temos uma grande torcida, mas a do Mengo ainda é a maior; temos 26 títulos Paulistas, 4 Brasileiros, 1 Mundial, mas há outros com um currículo maior; temos a Fazendinha, um estádio acanhado para o tamanho do Timão (e mesmo o novo prometido - e em início de obras e com a vergonhosa cessão de dinheiro público na forma de isenção de impostos - não será o mais reluzente do mundo); tivemos Sócrates, Ronaldo, Rivelino, Garrincha (baleado) mas nunca tivemos Pelé, Zidane, Zico... Verdade que nossa cota de patrocínio é a maior do país, mas não se compara nem de longe com os dos grandes clubes europeus.

Temos momentos únicos em nossa história: a invasão do Maraca em 1976, o gol da libertação de Baltazar no ano seguinte, a Democracia Corintiana (que se inscreveu não apenas na história particular da agremiação, mas no momento histórico do país - que sairia logo depois da malditadura). Sem falar em sua fundação que ganha ares míticos dos operários humildes que resolvem sob a luz do lampião fundar o clube.

É, no entanto, na relação orgânica com a torcida que o Corinthians se faz único. Há torcedores fanáticos em todo canto de grandes clubes. É possível que outras massas façam loucuras maiores pelo time do que o Bando de Loucos. No entanto, em nenhum outro há uma máxima como: "O Corinthians é o time do povo e é o povo quem vai fazer o time" (linda frase de seu primeiro presidente, Miguel Bataglia) ou refraseada como: "Todo time tem uma torcida, o Corinthians é a única torcida que tem um time".

Essa relação se traduz em uma palavra: corintianismo. Veja bem, não existem são-paulismo, palmeirismo, santismo, barcelonismo, manchesterismo (ou unitedismo), realismo (como referente ao Real ou madrilismo). O mais perto que chega do corintianismo é o flamenguismo - mas mesmo assim é de beeeem longe. O corintianismo não é o fanatismo pelo Corinthians. E é mais do que apenas amor pelo clube. É, antes, uma total identificação. Não com o time, não com o clube, mas com a própria ideia de Corinthians. O corintianismo já foi definido como uma filosofia e uma história compartilhada de sofrimento ("corintiano maloqueiro e sofredor, graças a deus"). E devemos completar: redenção.

Já compararam o corintianismo à religião. Curiosamente, dentro do cristianismo, houve (e há) um fenômeno denominado igualmente corintianismo: referindo-se aos coríntios (a quem, em suas epístolas, dirige-se, ah, ironia, São Paulo) - uma visão hipersupernaturalista (na qual curas miraculosas e outros milagres eram vistos como fins em si mesmos). Mas corintianismo como religião não capta toda a verdade e sutileza da coisa. É uma matriz de pensamento, sentimentos, atitudes e conhecimentos que unem cada corintiano a outro corintiano. Os outros times não têm um -ismo como o corintianismo pela ausência dessa matriz: um torcedor não está diretamente conectado a outro torcedor, antes eles se ligam por meio do clube - em uma formação de conexão em hub, não em matriz (as referências são do próprio clube e não da história comum entre os torcedores: tire o clube e não restará nada de partilhado). No corintianismo, embora o clube seja essencial, não é ele mesmo quem faz essa conexão de paixão em comum (embora haja também essa via). A torcida corintiana tem uma história em comum por ela mesma, uma história que inclui a do clube, mas que vai além.

O sofrer do corintiano é um regozijo não pelo próprio sofrimento - não se trata de uma tara masoquista - mas sim pela certeza reconfortante de que haverá superação. Aí está o ingrediente da tal 'raça corintiana', a persistência na lida mesmo quando tudo o mais conspira contra, o lutar contra todas as adversidades e vencer o adversário mais rico, com mais recursos, o favorito. Essa é a identificação com as camadas mais populares (mesmo em se tratando de torcedores em condições socioeconômicas superiores). Não é o toque refinado, a cadência elegante das academias e das máquinas, é a vitória do não-desistir ("aqui é curíntia, mano"), é o rocky balboa, é a glorificação da perseverança. Os jogos do Corinthians são uma alegoria da própria vida do torcedor corintiano. E mais uma coincidência: essa entrega desinteressada, com o intuito de não mais do que vencer pelos próprios méritos a despeito das limitações casa-se com a noção de corintianismo que vem do olimpismo - aqui o corintianismo é o ideal do esporte amador, o coríntio como o atleta que compete por amor, sem se aviltar por pagamentos.

Assim o que faz do Sport Club Corinthians Paulista o Corinthians não é a Fiel, nem o próprio Corinthians, mas a simbiose absoluta, completa e indissolúvel entre ambos: o corintianismo. E corintianismo, mermão, nenhum outro clube tem.