A Folha Online publicou o comentário de uma leitora - médica geneticista que terminou o mestrado em 2008 no Instituto Fernandes Figueira - contrária à decisão do STF (ainda que de modo tácito apenas).
Basicamente podemos resumir em dois pontos: a) suplementação da dieta da gestante com ácido fólico (vitamina B9) e b) abertura de precedente para a permissão de interrupção de gravidez em outros casos.
A suplementação com ácido fólico, como a própria autora do comentário diz, reduz o risco de ocorrência de malformação congênita do feto em caso de gestantes com tendências genéticas de 25% para 3% - índice para a população em geral. Bem, se há um risco de 25% para certos grupos, porque na população em geral o risco é de somente 3%? Resposta: porque o tamanho desses grupos com alto risco é pequeno.Ou seja a observação da médica: "Vê-se aí que o mais importante sobre a anencefalia não está sendo comentado, ficando toda a discussão sobre a questão do aborto." não tem sentido estatístico - 3% da população em geral é muito, mas muito, mas muito maior do que os 25% dos casos específicos - não tem então como ser "o mais importante".
De todo modo, mesmo com a suplementação o risco não desaparece. E nem é tão baixo: 3% das gravidezes com algum tipo de malformação (nem todos de anencefalia). No Brasil, são 3 milhões de partos por ano, mais ou menos. Isso corresponde a 90 mil casos de má-formação congênita por ano - com ou sem suplementação de ácido fólico. (Atenção: bom dizer que uma campanha de esclarecimento e de fornecimento de suplementos é importante e tem seu valor, mas nem de longe irá acabar com o drama de gestação de fetos anencéfalos.)
O segundo ponto: "Além disso, a descriminalização de aborto dos anencéfalos abre precedente para o aborto de outras malformações fetais letais, podendo estender-se para aquelas condições com letalidade aumentada (como a síndrome de Edwards e a síndrome de Patau). É uma postura delicada que beira a eugenia." Esse tipo de raciocínio tortuoso é tão comum que tem até um nome especial: "falácia do declive escorregadio". Fácil ver que se isso valesse, valeria o inverso: "Impede-se a mulher de interromper a gestação de feto inviável e se abre um precedente para impedir o aborto em qualquer circunstância - mesmo sob o risco da mulher morrer."
sábado, 14 de abril de 2012
Um pouco mais sobre anencefalia
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