Não poucas pessoas, inclusive muita gente boa, desconfiam que tais eventos não se devam a acidentes, mas sejam talvez provocados por pessoas mal intencionadas tentando se livrar da presença de aglomerações urbanas subnormais - talvez, sugerem, por especulação imobiliária, tentando obter terreno barato para novos e lucrativos empreendimentos e valorizando os imóveis ao redor.
Há, porém, uma explicação bem mais prosaica. Todo fogo precisa de três elementos - combustível, comburente e energia. Nessas construções improvisadas há uma grande quantidade de material facilmente combustível - a começar pelas paredes de madeira e papelão. O comburente é abundante no ar. E, com ligações elétricas clandestinas - os gatos - e sobrecarga sobre fiações inadequadamente dimensionadas e remendadas, fonte para ignição não é problema.
De todo modo analisemos os padrões temporais de ocorrências de fogos nas favelas. Uma iniciativa colaborativa muito interessante tem compilado tais casos de diversas fontes: o Fogo no Barraco. Há dados fornecidos pela Defesa Civil para os anos de 2005 a 2009. Dos anos de 2010 a 2012, os dados foram levantados pelo FnB a partir de notícias publicadas na internet.
Na figura 1, apresento o gráfico da variação do número de incêndios com média de 5 dias ao longo dos anos - de 2005 a 2009.
As médias (das médias de 5 dias) e os desvios padrões são respectivamente: 0,31(0,21); 0,29(0,22); 0,28(0,22); 0,29(0,23) e 0,28(0,19). Não é possível nem mesmo dizer que há um aumento no número de ocorrências de incêndios em favelas.
Para os anos de 2005, 2006 e 2008 há picos por volta da primeira semana de julho e primeira semana de agosto. Em pleno inverno.
Na Figura 2, mostro (em números cumulativos) os casos de incêndios em favelas paulistanas relatadas pela mídia entre os anos de 2010 e 2012. (Faço as análises separadamente do conjunto anterior dos dados pelas diferenças metodológicas da coleta dos dados.)
Para os anos de 2010 e 2012 é nítido o aumento de casos próximo ao fim do inverno. Que é a mesma conclusão geral para a análise dos dados colhidos com a Defesa Civil.
E é justamente no inverno que menos chove em São Paulo*. Sendo o balanço hídrico reduzido entre julho e agosto. (Para piorar, ainda há a prática de liberação de balões durante as festas juninas - que podem avançar para julho.)
As investigações realizadas sobre as causas dos incêndios nas favelas são bem vindas. Mas o poder público, em especial a prefeitura, poderia ter medidas mais eficientes de combate aos incêndios nesses locais vulneráveis - coisa que parece não ocorrer hoje.
*Upideite(15/set/2012): Na Figura 3 é apresentada a variação média da precipitação e da umidade relativa do ar em São Paulo ao longo do ano (período: 2005 a 2011).