O pesquisa online realizada pelo site Olga tem tido bastante repercussão e foi objeto de reportagem do sítio web da revista Época.
De um lado é importante que a questão da "cantada de rua" - bandeira de várias feministas, como o próprio pessoal do Olga, do Cantada de Rua, Blogueira Feministas e outras - ganhe mais visibilidade para discussão. Só não estou muito certo a respeito do papel que tal visibilidade -e a consequente discussão - tem dado à percepção masculina a respeito das cantadas*. Há, de certo, um número grande de manifestações negativas e até grotescas, mas não sei quão representativo isso é do universo masculino.
Mas é preciso colocar em perspectiva ainda a representatividade da pesquisa "Chega de Fiu Fiu" promovida pelo Olga. O viés de autosseleção pode ter atuado de modo bastante intenso. Clara Averbuck enfatiza que foram 8 mil mulheres, das quais, 83% disseram se sentir, no mínimo, incomodada com as cantadas recebidas. Por outro lado, uma pesquisa nacional encomendada pela fundação Perseu Abramo em 2001 (a respeito da qual comentei aqui mesmo no NAQ), mostrava um número diferente: dos 73% de mulheres que disseram já terem sido cantadas, 43,8% se diziam incomodadas com as cantadas - o restante recebia como elogio, não ligava ou achava que dependia da cantada.
Será que a situação mudou nestes últimos 12 anos? É possível que, sim. Mas é possível que não. Ou pode ter mudado em outra direção. Como já disse antes, há mulheres que *declaradamente* gostam de ser cantadas. E, mais uma vez, não estou com isso dizendo que então tudo bem os homens abordarem indiscriminadamente as mulheres - o ponto que gostaria e muito de debater é *como* diferenciar as que gostam de ser cantadas das que não gostam (mas até o momento não venho sendo bem sucedido em obter um diálogo a respeito com a parte feminista contra as cantadas).
Minha sugestão é que seja feita uma pesquisa nacional representativa - digamos, 1.000 entrevistadas em todo o território nacional segundo os critérios de corte censitário. Um instituto de pesquisa haveria de ser contratado. O valor seria levantado via crowdfunding. Uma pesquisa completa deve sair na casa dos 200.000 a 500.000 reais, mas uma mais compacta (feita juntamente com várias outras pesquisas) pode sair mais em conta (embora menos detalhada): algo como 50 mil reais.
*Upideite(14/set/2013): Há pesquisas que indicam que o confrontamento de diferentes opiniões podem levar a um acirramento da oposição.
quarta-feira, 11 de setembro de 2013
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8 comentários:
Talvez soe um pouco provocativo, mas não é essa a intenção. Num post antigo, sobre diferenças salariais entre homens e mulheres, você disse que não importava se a diferença real era 15% ou os 30% comumente afirmados pelas feministas. Então não entendi muito bem o ponto agora. Qual a diferença, para fins de argumentação, entre os 80% de uma pesquisa e os 60% de outra?
Você quer debater como diferenciar as mulheres que "gostam" de receber "cantadas" das que não gostam?
e isso valeria de quê em termos práticos?
cantada de rua dura 3 segundos na maioria das vezes. os caras falam o que querem, dão o seu juízo de valor sobre a aparência de mulheres que eles nunca viram na vida e saem andando.
não podemos nem chamar isso de interação, porque numa interação pelo menos duas pessoas participam ativamente.
então qual a sua intenção ao querer saber diferenciar quem são as mulheres que gostam dessas "cantadas"?
Quanto a questão principal. Acho necessário restringir a discussão apenas às cantadas de rua, em que não há um objetivo de estabelecer uma relação, e é grande a probabilidade da mulher ser agredida se reclamar da cantada. Nesse caso, no contexto atual de violência que vivemos, penso que deveria ser abolida (por campanhas de conscientização e talvez alguma sanção leve) porque geram desconforto e insegurança para uma fatia importante de mulheres. Seria algo similar a proibir o fumo em ambientes fechados ou procurar evitar soltar pum no elevador.
André,
Se houvesse uma pesquisa de opinião entre as mulheres, haveria diferença se 80% das mulheres se sentissem aviltadas com a diferença salarial ou se "apenas" 48% sentissem isso.
Quanto à insegurança e desconforto, justamente pra isso que:
1) faz a diferença saber quantas realmente estão se sentindo inseguras e desconfortáveis;
2) seria bom se fosse possível distinguir as que não gostam das que gostam - no equivalente fumígero, quais as áreas permitidas ao fumo e quais as proibidas.
Juliana,
Valeria que as que não gostam não seriam incomodadas, sem que as que gostam precisassem deixar de receber a interação.
Agora, sim, haveria ainda um bom número de babacas que continuariam a incomodar as que não gostam. Mas até aí, pra esses, qual a diferença em saber se 90% das mulheres não gostam? Ou que parte das feministas acham isso degradante?
[]s,
Roberto Takata
"...haveria diferença se 80% das mulheres se sentissem aviltadas com a diferença salarial ou se "apenas" 48% sentissem isso."
Não entendi. No caso das diferenças salariais, acho importante saber o valor correto e a origem, porque a "solução" a ser adotada, em geral, depende disso. Mas eu ainda não consegui entender a diferença que você vê nas duas questões.
Também acho que seria bom que houvesse um meio de identificar quem gosta ou não gosta de galanteios. Talvez um pulserinha da cantada, mulheres que curtem usariam e a gente ficaria livre para dizer gracejos a ela. Pulserinha rosa habilita chamar de princesa. Pulserinha vermelha pode chamar de gostosa. Pulserinha roxa pode dizer que chupava todinha.
André,
1) Onde eu disse que não importava se o salário fosse de 30% ou de 15%?
2) A diferença é que "diferença de salário" não é a mesma coisa que "opinião a respeito da diferença de salário". "Diferença de salário" seria mais ou menos equivalente à "porcentagem de mulheres que já foram cantadas na rua".
3) Deixo para as mulheres entrarem em acordo entre elas sobre que sinais os homens podem usar para distinguir os grupos.
[]s,
Roberto Takata
É certo que 100% das mulheres que não gostam de cantadas não gostam de cantadas. Parece um desperdício de tempo tentar explicar aos cidadãos que estão sendo grosseiros: acho que eles sabem muito bem quando estão sendo grosseiros. A questão é que a linha que diferencia a cantada do assédio não é muito óbvia (se bem que os casos narrados na pesquisa são evidentemente assédio e não cantada). A gente aprendeu a suportar as grosserias como a única alternativa na defesa do direito de estar na rua: seria ilegal atirar no cara porque ele te chamou de gostosa. E digo de novo: machos fazem isso para serem machos e não porque estejam interessados na fêmea enquanto sujeito.
Oi, Mari,
Sim, tem uma zona mais cinza aí.
Aliado ao fato de haver pelo menos dois grandes grupos - as que gostam e as que não gostam, isso, a meu ver, torna necessárias duas coisas:
a) Uma melhor conceituação do que seja "cantada de rua" ou "de pedreiro" ou "de feirante".
b) Uma forma de se poder distinguir de antemão os dois grupos.
(Isso à parte a questão da violência propriamente dita e de atos mais grosseiros.)
[]s,
Roberto Takata
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