Esta é uma obra de ficção. Qualquer coincidência com a realidade será mera semelhança.
(
Capítulo 1 aqui.) (
Capítulo 3 aqui.)
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"Regino,
não há nada a temer. Nossa maioria é folgada. Anistia ampla, geral
e irrestrita está garantida. Pode tratorar, passa a corrente,
precisamos ampliar a área de produção já que estamos produzindo
menos por hectare."
Pelo
celular, George seguiu acertando com o capataz as ordens do mês para
a Fazenda Rebelo, ao norte de Mato Grosso, na fronteira com Rondônia.
Dali a pouco estaria in loco para acompanhar o término das obras da
pista de pouso. A emenda parlamentar fornecera a verba necessária
para a construção do aeroporto municipal. Sim, dentro da Fazenda Comuna Rebelo. Tecnicamente a área havia sido doada para a prefeitura, mas
um obscuro mecanismo havia conferido o uso preferencial pelo antigo
dono – o dono de fato. De todo modo, em uma cidade com menos de
três mil habitantes, o único a efetivamente usar o aeródromo seria
ele mesmo e seus funcionários. E, eventualmente, alguma autoridade.
A
obra havia sido brindada com autorização para a derrubada da
floresta – com um EIA-RIMA produzido a toque de caixa e sob medida
– incluindo uma faixa no entorno. Faixa que foi alargada e parte
substancial seria ocupada para cultivo da soja. "Seria um pecado
deixar um pedaço de terra tão bom sem uso."
A
área avançaria sobre a porcentagem da reserva legal. Era com isso
que o capataz estava apreensivo. Alguém havia buzinado em seu ouvido
de que daria encrenca. Ouvir as palavras de George o deixava mais
tranquilo. Afinal, a propriedade estava em nome do capataz. Se
encrenca houvesse, sobraria só para ele.
Da
janela do quarto, George via o morro. Tão belo era em sua memória das
incontáveis vezes em que se hospedara ali. Uma linda floresta a
cobri-lo da base ao topo. Mas agora. Agora horrendas casas subiam sua
encosta, substituindo as árvores que tanto lhe alegravam os olhos.
Não se ouviam mais o canto dos pássaros de antes. Não chegou a
formular completamente uma maldição sobre aquele aglomerado urbano
subnormal.
Do
chuveiro uma voz entoava uma canção.
"That
the river burns like the gasoline..."
A
água cessou, mas os versos continuaram a ser entoados:
"...And
they can't turn on the rain machine. And they tell me there is no
more space. Won't you turn around..."
Saindo
de roupão e enxugando a cabeça, aproximou-se de George que, calado,
mirava o morro.
"Cuz
I hate when I cannot see your face..."
Ela
abraçou-se a George, recostando sua cabeça no ombro do amado – na
verdade no braço, dada a diferença de altura entre eles. George
baixou sua mão correndo as costas da menina terminando o percurso
com uma apalpada.
Flora
soltou um gritinho de falsa indignação.
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